A mensagem

Foi tudo tão rápido que não deu tempo de assimilar. O choque da dor percorreu o meu corpo, paralisando-me por completo. Naquele momento, uma neblina negra inundou os meus olhos, e o meu mundo escureceu. O clarão veio em seguida, levando embora a agonia insana, cedendo lugar a uma paz ilógica. Os ruídos da minha mente silenciaram, como se soprados por uma corrente de luz, uma brisa vinda de um lugar desconhecido. Uma voz dentro de mim sussurrou:

Bem-vinda, Ava.

Aquelas palavras me confundiram. Quem estava falando comigo?

Onde estou?”Meu pensamento ecoou na vastidão, iluminada por muitos pontos de luz ao meu redor, suas cores alternando entre lilás, azul celeste e dourado. Um túnel de luz se abriu em meio à uma constelação de tirar o fôlego. Sem aviso, fui atraída para ele, como se fôssemos ligados por um tipo de cordão magnético. A passagem fulgurava com a mesma intensidade do Sol, mas eu podia enxergá-la sem dificuldade, e ouvir uma melodia agradável que soava através dele.

Meu olhar se estendeu ao longe, para a silhueta reluzente de um corpo. Um homem? Sua presença me hipnotizou, mas o véu de luz branca sobre seu rosto impedia-me de conferir seus traços. Um fulgor azul, emanando de seu corpo etéreo, expandia-se em ondas de frequência ao redor do vórtex. Tentei me aproximar, no entanto, senti algo me puxar para longe. O fulgor se tornou distante, até desaparecer por completo.

Não!

O clarão me tomou novamente e sussurros perturbaram os meus ouvidos. Meus olhos se abriram de espanto. Onde estou? Sombras esgueiravam-se sobre mim como se fossem me atacar. Cada ponto do meu corpo tremeu. Aos poucos, meus olhos foram se adaptando à nova realidade.

 — A pulsação voltou — disse uma voz rouca.

Seu rosto estava coberto por uma máscara azul e seus cabelos envolvidos por uma touca. Médicos. Estou em um hospital, concluí, ao me dar conta de que estava deitada em uma maca.

Fiquei um pouco confusa, decepcionada por ter saído daquele lugar incrível.

— Bem-vinda de volta, querida — disse um homem, enquanto injetava um líquido através do cateter fincado na minha mão. — Isso vai aliviar a sua dor.

“‘Bem-vinda’…” Também ouvi aquilo quando estava no portal de luz. Será que eu havia imaginado tudo? Os sussurros em minha mente eram reais? Eu me remexi na maca, precisava de uma explicação.

“Por quanto tempo eu fiquei inconsciente?” Eu não me recordava de nada, apenas do mundo etéreo…

— Fique tranquila. Você já está fora de perigo. — Os olhos de uma mulher sorriram para mim. Ela adaptou a máscara de oxigênio em meu rosto e eu senti a cabeça latejar.

Eu bati a cabeça? Como vim parar aqui? A minha mente lutou para puxar memórias recentes, mas era como uma tela em branco. Um longo suspiro se soltou de meu peito.

Pelo menos eu sabia quem era. Meu nome é Ava Nunes, sou brasileira, tenho 26 anos e moro com uma tia que não me ama. Terminei um namoro recentemente e agora estou desempregada. Uma lágrima escorreu de minha face. Não me recordo de ter realmente amado ninguém… apenas os meus pais. Não tenho ninguém.

— Podem levá-la para o quarto — o homem avisou para a equipe. Percebi que ele estava no comando de tudo. — Ela não vai poder receber visitas por enquanto.

— Ok, Dr. Roberto — a mulher assentiu com a cabeça.

Do nada, um flash rápido tomou o meu consciente. Uma cena amedrontadora. Vi o meu corpo sendo atingido por um automóvel vindo em alta velocidade. Um gemido se soltou de meus lábios, mas o som foi abafado pela máscara de oxigênio. Meus braços se agitaram.

— Fique tranquila. — Senti uma mão segurar a minha.

Olhei para a pessoa que tentava me tranquilizar. Um lindo rapaz. Uma luz azul saía ao redor da sua cabeça Ele não estava usando máscara como os outros, e sorria para mim como se me conhecesse. Tive um lampejo de reconhecimento, ele me era familiar.

Eu vi você… Vi você naquele túnel.” Meu pensamento soou alto como se eu estivesse falando. “O que você quer? Por que está aqui?

Eu lhe dei mais uma chance, Ava.” A voz suave e celestial mergulhou dentro de mim. “Não a desperdice.

Você é um anjo?

Não importa quem eu sou.” Seus olhos de fogo fulguraram. “Você precisa alcançar o seu propósito aqui. Ainda não completou o seu ciclo. O caminho é começar a enxergar a sua própria essência.

Refleti em suas palavras, tentando compreender o sentido daquilo tudo. Parecia um sonho, mas eu sabia que era real, sabia que eu não estava louca. Eu me voltei para a enfermeira que estava do outro lado da maca, seus olhos atentos no corredor. Ela não está vendo o rapaz, nem mesmo nos escutando. Ouvi o ruído das rodas da maca ecoando no ambiente frio, as luzes no teto se movendo enquanto eles me levavam. É mesmo real… O anjo é real. Voltei-me novamente para o ser iluminado.

Como assim, ‘a minha própria essência’? Como eu faço isso?

Ele abriu um sorriso luminoso. O fulgor índigo, margeando o seu corpo, se intensificou numa luminescência hipnotizante. Meus olhos ardiam ao encará-lo.

É um segredo simples, mas infelizmente, a maioria dos seres humanos tem dificuldade para realizar tal proeza. A culpa gera rancor e frustração. Livre-se dela, Ava. Perdoe-se. Só assim, vai conseguir entender o que é o amor. Só assim se sentirá amada.

Meus olhos marejaram, e lágrimas escorreram pela minha face. Ele havia tocado na minha ferida mais profunda.

Eu sempre me senti culpada por tudo. Por não ser forte o suficiente, inteligente o suficiente… Até mesmo, por não conseguir demonstrar o meu amor por ninguém.

Quando o anjo voltou a me encarar, uma sensação diferente me envolveu. Era como se ele enxergasse meu âmago, como se me conhecesse mais do que eu mesma.

Esse sentimento deixa uma marca na alma. A culpa é devastadora e… impede a expansão da consciência.

Suspirei alto, esvaziando o ar dos meus pulmões.

“E se não conseguir me livrar disso? É… muito difícil.

A resposta foi tão direta que me assustou:

“Eu virei te buscar. Você terá que renascer outra vez e… passará por outra vida dificultosa até compreender. Até compreender que você não é uma vítima. O ciclo irá se repetir.

“Mas… Nada na minha vida dá certo. A solidão está me matando.

Ele segurou a minha mão direita com carinho. Meu coração se acalmou.

“A sua vida pode mudar se você mudar a sua visão de vida, a sua perspectiva em relação a tudo e a todos. Seus sentimentos são o reflexo da sua realidade.

Deixei que aquela resposta se alojasse em meu coração. Eu precisava encarar a minha jornada de uma maneira mais positiva.

“Eu quero continuar vivendo… preciso tentar. Quanto tempo tenho para conseguir transformar a minha visão do mundo?

O anjo não respondeu, mas seus olhos responderam por ele. Sua atenção se voltou para outro lugar. Olhava para algo distante, algo que eu não conseguia ver e nem mesmo penetrar. O toque de sua mão em meu rosto eletrizou a minha pele e meu corpo inteiro relaxou. Eu lutava para me manter acordada, mas minhas pálpebras pesavam. Quando os abri os olhos, vi a imagem dele se desfocando, tornando-se insólita, surreal…

Até sumir.

Estava sozinha no quarto do hospital. Sozinha novamente, mas agora não me sentia solitária. A medicação estava fazendo efeito, e deixei que ela embalasse meu sono como a mensagem do anjo acalmou minha alma.

O tempo é uma ilusão. Tudo o que você tem é o agora.”

Um novo olhar

O estrondo da tempestade despertou-me de um sonho sinistro. Trêmula, ergui o meu tronco da cama e limpei o suor escorrendo da minha nuca. Meus pés, ainda fragilizados pelos malditos saltos finos que eu resolvera usar na noite passada, tocaram o chão frio. Afastei o cansaço e caminhei até a janela panorâmica.

A incrível vista do Central Park mostrava-se escurecida. Por trás do vidro gotejado, relâmpagos rasgavam o breu da noite. A cena do sonho estranho lampejou no mesmo instante em que outro raio rompeu ao longe.

Um homem sem rosto estava sentado em um banco, murmurando palavras incompreensíveis. Suas roupas eram trapos sujos e suas mãos acariciavam um cachorro de rua. De súbito, ele se ergueu e veio em minha direção. Dei um passo para trás, mas antes que eu pudesse correr, algo sobrenatural aconteceu: o seu corpo levitou, tornando-se tão reluzente quanto um diamante. A luz forte me obrigou a fechar os olhos, porém, quando os abri, realizei o seu fulgor avançando sobre mim, tomando-me por completo.

Esfreguei os meus braços e apertei as pálpebras. Parecia tão real. Soltei um suspiro alto e olhei para o relógio digital sobre a cabeceira: quatro e meia da manhã.Balancei a cabeça em negação. O meu dia não seria fácil, e ia ficar pior ainda se a minha mente assonada não estivesse funcionando cem por cento. Fechei a cortina translúcida, tomei um copo de água e voltei para a cama. Puxei o lençol sobre as minhas pernas e fechei os meus olhos.

Fiz um esforço enorme para me concentrar em algo relaxante, mas nada parecia acalmar o fervor dentro de mim. Eu sabia que, se eu resolvesse pegar o celular, meu sono iria por água abaixo, mas não pude resistir. A ansiedade era maior que eu, maior que a vontade de dormir. Ao ligar o aparelho, uma mensagem de voz apareceu na tela principal. Leo. Engoli o medo, como quem engole um comprimido a seco. Sua voz rouca soou baixa, com uma nota de tristeza.

— Acabou, Catherine. Nosso relacionamento… Não dá mais.

A sua respiração se alterou, assim como o meu coração.

— Você sabia desde o princípio que eu estava com Angie. Eu não escondi nada de você. Não posso mais me arriscar. Eu tenho uma sociedade com o pai dela e… você sabe como o velho é. — Um suspiro angustiado cortou suas palavras. — O cara já estava de olho na gente. Ele quer você fora da empresa, Catherine. É melhor você nem aparecer amanhã… Jack vai assumir o seu lugar até encontrarmos outra pessoa. Eu… sinto muito.

O celular escorregou das minhas mãos. Minha cabeça tombou no travesseiro, pesada, como se fosse uma bola de metal. Meus ombros se retesaram. Abracei os meus joelhos, encolhendo-me de vergonha. Vergonha por ter me envolvido com o vice-presidente da empresa … e ainda por cima, noivo. Joguei tudo fora por causa desse crápula. Todo o meu empenho e dedicação. Sete anos lutando para conseguir chegar aonde cheguei. Lágrimas desceram quentes pela minha face.

— Sua idiota! — xinguei a mim mesma, em um rompante de irritação.

Fiquei um tempo sem me mover, sentindo o mundo desabar em minha cabeça, a mágoa me devorando por dentro, abrindo caminho para pensamentos sombrios. Olhei com amargura para as cicatrizes em meus pulsos. Um arrepio cruzou a minha espinha. Eu não posso me entregar novamente, não quero mais entrar nessa maldita escuridão.

O fatídico dia em que tentei tirar a minha vida voltou em minha mente como um pesadelo. Assim como as cicatrizes, aquele momento ficaria marcado para sempre, guardado em um lugar profundo, um lugar que eu não gostava de acessar. Já se passaram doze anos e parece que foi ontem. Em um surto de loucura, saltei da cama e fui até o bar montado na sala principal. Abri a garrafa de uísque escocês, presenteado pelo infeliz que me dera o fora. Peguei um copo de cristal e despejei o líquido amarelado como se fosse um simples refrigerante.

Merda!

O meu lado sensato reprimiu-me, mas o lado sofredor ganhou em disparada. Ergui o copo, brindando a volta da bebedeira, do vício que não me deixava em paz. Meu reflexo no espelho preso à parede abriu um sorriso nervoso, um sorriso de derrota. Que se dane! Sorvi um gole que desceu queimando, amortecendo o que não poderia ser sanado. A última gota não acalmou o meu anseio. Enchi o copo novamente, repetindo mais duas rodadas, até não restar mais nada.

***

Acordei com o barulho do interfone, a cabeça girando e a visão embaçada. Eu havia adormecido no sofá da sala – na verdade, desmaiado era a expressão correta. Ergui o meu tronco devagar, incomodada com o barulho incessante, caminhei em passos lentos até a cozinha e atendi o interfone. A voz do porteiro soou como uma buzina, avisando-me que alguém deixara uma caixa com alguns pertencentes. Eu já sabia o que era.

O desgraçado pediu para recolherem as minhas coisas do escritório, só para que eu mesma não fosse lá fazer isso. Meus olhos se encharcaram de mágoa. Sentindo a boca seca e um pouco de enjoo, bebi dois copos de suco de cranberry para aliviar o estômago. Preciso sair daqui.

Uma ducha gelada e roupas apropriadas para corrida depois, peguei o elevador e não gostei do que eu vi no espelho. Não eram as minhas olheiras que me incomodaram, mas a tristeza no interior dos meus olhos, o vazio inquietante, como se a minha alma tivesse sido soprada do corpo. O que estou fazendo com a minha vida?

A culpa apertou o meu peito e eu fechei os olhos, tentando imaginar uma saída, esforçando-me para não ser levada pelo emocional. A vingança só vai me destruir ainda mais… Um suspiro longo se soltou do meu peito. Assim que a porta do elevador abriu, vesti um boné e saí correndo em direção ao Central Park.

— Cuidado! — um motorista de taxi xingou, gesticulando com a mão para fora da janela.

Dei-me conta de que eu estava desatenta, atravessado a rua enquanto emergia na mensagem deixada por Leo no meio da madrugada. A voz dele martelando dentro de mim, danificando meu coração. Abaixei a aba do boné e continuei o percurso, desviando dos carros e das pessoas que atravessavam o meu caminho. Acelerei o passo ao entrar no parque, a natureza ao meu redor tornando-se um borrão esverdeado. Meu coração se apertou ao lembrar-me de que, no dia seguinte, eu faria trinta e sete anos. Eu perdi tudo… perdi tudo o que era de mais valioso pra mim.

— Isso não é verdade — uma voz sussurrou.

Parei abruptamente. Girei meu corpo, varrendo o local com os olhos. Não havia ninguém próximo, mas ao longe havia um senhor sentado em um banco. Era um mendigo, na faixa de uns 70 e poucos anos. Ele acariciava um cachorro e conversava consigo mesmo. De imediato, o sonho da noite passada se abriu como um filme. Mesmo amedrontada, me aproximei dele. O cachorro sentiu a minha presença, abanou o rabo e latiu.

— O senhor falou comigo? — murmurei, apreensiva.

Ele ergueu o olhar e eu congelei. Seus olhos eram envidraçados, duas esferas em um tom azul-claro. Ele é completamente cego, mas me encara como se não fosse… Todos os pelos do meu corpo se eletrizaram.

— Sim, Catherine. — Ele abriu um sorriso vibrante. — Eu falei com você.

Olhei para ele abismada. Demorou até que eu o questionasse.

— Co… como sabe o meu nome? — gaguejei, sentindo o meu coração bater forte.

Sua expressão se tornou séria. Ele se ergueu do banco com uma agilidade impressionante e se aproximou. O seu olhar lácteo sustentou o meu, e vi algo lampejar no interior daquela imensidão alva.

O homem não respondeu a minha pergunta. Apenas sorriu novamente.

— Eu posso sentir a sua tristeza. — A sua voz mansa me tocou. Lágrimas se formaram em meus olhos. — Sabe, a felicidade está dentro de você e… não fora. — Ele silenciou por um momento e pousou uma de suas mãos sobre o seu casaco rasgado. — O seu mundo interior é especial. Não precisa de ninguém para ser feliz. O sucesso está no prazer de viver, na alegria das coisas simples… coisas que jamais paramos para pensar

Ponderei suas palavras. Ele estava tão próximo que podia sentir o seu hálito quente. Quem é esse homem? De alguma maneira, algo se acalmou dentro de mim. Eu tirei o meu boné e limpei as lágrimas escorridas do meu rosto.

— É difícil — murmurei, encarando o seu rosto envelhecido. Seus cabelos tão alvos quanto seus olhos. — Sinto como se eu travasse uma guerra todos os dias. Procurando atingir um ideal perfeito… um ideal impossível.

Ele suspirou alto. Um brilho reluziu ao redor de sua cabeça.

— O ideal de todo mundo deveria ser a paz. — Sua voz ecoou em meus ouvidos. — O caminho é agradecer pelo que você tem e… não pelo que você não tem.

Eu engoli a mágoa reprimida em meu peito.

— Eu já perdi tantas coisas… até mesmo a minha integridade.

Seu sorriso se abriu. Naquele momento, senti que o cego podia me enxergar mais do que qualquer pessoa já havia me enxergado.

— As perdas da vida fazem parte do aprendizado… da jornada de cada um. Todos os seres humanos passam por perdas, no entanto, isso os torna mais fortes. A consciência só se desenvolve dessa maneira. — Ele abriu os braços e respirou fundo. — A experiência da vida é incrível. Não a desperdice com bobagens. Tudo o que você joga para universo volta para você com uma força ainda maior.

Eu refleti no conselho do idoso. Eu sabia que, nos últimos anos, eu não estava tomando atitudes boas. O meu envolvimento com um homem comprometido era apenas uma das coisas dentro da minha lista de erros. Bebida em demasia, sentimento de vingança, passando por cima dos outros para conseguir atingir o meu objetivo, ódio de mim mesma, raiva, traição, gastos em excesso, culpa, futilidade, pouco valor à vida… Uma série de imagens do passado me tomaram. Eu olhei para o cego à minha frente, que parecia ter um conhecimento acima da maioria. A felicidade transbordava dele, transbordava de sua alma.

— Pense nisso, minha criança — ele murmurou, cruzando suas mãos sobre o seu coração. — Às vezes, o nada é tudo. Quando achamos que estamos perdendo… é a hora certa para mudar, passar repensar em uma vida melhor, uma vida que valha cada respiração.

Subitamente, o cachorrinho saltou em meu colo. Eu o apanhei no ar, aconchegando-o em meu peito. Tal como seu dono, o olhar do animal era reluzente, sua alegria contagiante. Eu afaguei sua cabeça peluda e comecei a me sentir melhor. Do nada, gotas de água começaram a cair do céu acinzentado. Voltei-me para o homem sábio. A chuva o atravessava como se ele fosse apenas um holograma.

Mas o que…? Minha boca se abriu. Olhos brancos que me observavam se tornaram dourados como ouro. O temporal se intensificou, e eu abracei o animalzinho.

— Lembre-se de mim quando a tristeza inundar a sua alma, Catherine. Lembre-se de que você é muito mais do que apenas um corpo.

Sua voz retumbou no ar. Percebi a sua imagem sumindo, tornando-se um ponto brilhante até viajar para longe, para um lugar além da realidade.

— Adeus — murmurei, ainda chocada com o que eu havia presenciado.

O cão lambeu o meu rosto, despertando-me da imersão. Eu respirei fundo e sorri para ele.

— Você vai comigo para casa?

Ele balançou o rabo. Entendi como um sim.

Agradeci a paz deixada pelo sábio. Deixei a chuva lavar a minha alma por um tempo, limpar toda a sujeira acumulada. Caminhei devagar, abraçada ao me novo companheiro, absorta na paisagem ao meu redor, até chegar em casa. Voltei decidida a encontrar um novo caminho… encontrar a paz que eu perdera há muito tempo, a enxergar, mesmo no meio da escuridão. No fim, o ensinamento do ser de luz disfarçado de mendigo baseava-se em uma coisa só:

“Jogue amor e recolha amor”. Essa é uma das leis do universo.